Porque devemos evitar usar palavras como “deficiente”?
Na Stannah, dizemos “sim” à utilização da linguagem positiva e ao desafio de criar mais pontes de acessibilidade.
Escrito por Stannah
No dia a dia, é frequente sermos confrontados com a necessidade de entendermos melhor a diferença entre palavras e expressões como “deficiência” e “deficiente”, “incapacidade” e “inválido”, “pessoa com deficiência”, “pessoa com diversidade funcional” ou “diversamente funcional”. Ao mesmo tempo, somos levados a refletir sobre qual é a melhor expressão ou palavra a utilizar. E por que razão fazemos isto?
Porque vivemos num tempo em que os consumidores já não são meros espectadores, mas verdadeiros protagonistas na sua viagem rumo a uma vida com mais qualidade, em plena igualdade de oportunidades, e onde o respeito que recebem das marcas deve ser genuíno, começando pela forma como comunicamos.
Por isso, hoje centramo-nos sobre a influência da linguagem positiva e sobre a capacidade das palavras para ferir, curar e mudar vidas.
O que podemos melhorar na nossa linguagem?
Com base no trabalhado desenvolvido por Luis Castellanos no campo da neurociência cognitiva na Universidade Complutense e no Instituto de Saúde Carlos III de Madrid, sabemos hoje que é possível melhorar a nossa saúde e bem-estar através do bom uso da linguagem, uma vez que a linguagem e as emoções estão interligadas e diretamente relacionadas com as decisões vitais que cada ser humano toma ao longo da sua vida.
Através das palavras de Luis Castellanos, sabemos que:
“O mais importante sobre a linguagem, e a linguagem positiva e palavras positivas, é que estas nos dão uma energia que anteriormente não sabíamos que vinha da linguagem. Agora sim, sabemos que vem da linguagem.”
Em Portugal, e de acordo com os Censos de 2011, cerca de um milhão e 700 mil portugueses têm um tipo de limitação física, intelectual ou sensorial que os inibe de executar uma ação como ver, ouvir, andar, memorizar, tomar banho de forma independente, entre outras ações.
Conheça os vários tipos de incapacidade.
Associado a esta realidade, acresce que desde 2017 as queixas por discriminação a pessoas com deficiência têm vindo a aumentar.
Torna-se, assim, urgente amplificar a nossa capacidade de utilizar uma linguagem mais positiva para descrever o mundo à nossa volta. Para as pessoas com deficiência, a mudança começa por ver o respeito, compreensão e interesse da sociedade refletido na forma como comunicamos.
Por isso, é importante começarmos por entender o que distingue palavras e expressões como “deficiente” e “pessoa com deficiência”, e o impacto que estas podem ter.
Qual é o termo mais inclusivo: “deficiente” ou “pessoa com deficiência”?
Segundo o manual de Interação com a Pessoa com Deficiência publicado pelo IEFP, é importante reconhecermos o poder da linguagem e a forma como esta pode afetar negativamente aqueles com quem interagimos.
A utilização de termos como “deficiente” ou “deficientes”, por exemplo, subentende “um grupo de pessoas homogéneo e separado do resto da sociedade”. Porém, as pessoas com deficiência não constituem um grupo separado do resto da sociedade, são parte integrante da mesma e devem ser respeitadas como tal. Enquanto indivíduos, todos possuímos características que nos distinguem uns dos outros, mas no sentido mais abrangente fazemos todos parte da mesma sociedade.
Segundo o dicionário da Porto Editora, deficiente significa:
Do latim deficiente-, «idem», particípio presente de deficĕre, «fazer falta». Pessoa que apresenta insuficiências a nível físico ou mental (nome de 2 géneros); em que há deficiência; incompleto; falho; imperfeito (adjetivo de 2 géneros).
Todo o espectro de conotações negativas ligado à palavra “deficiente” é algo com que as pessoas com deficiência não desejam ser associadas, pois assenta na ideia de que estas são “menos capazes”, “menos válidas” ou “imperfeitas”. Este tipo de termos, com uma forte carga negativa, está muitas vezes associado à constante negação de oportunidades e de integração social das pessoas com deficiência e, por isso, devem ser evitados.
De acordo com o manual de Interação com a Pessoa com Deficiência, o termo mais inclusivo para fazer referência a pessoas com deficiência é efetivamente esse – “pessoas com deficiência” e não “deficientes”.
Porém, e apesar da recomendação do IEF, não há uma regra absoluta sobre qual a melhor terminologia a usar. É uma questão de avaliarmos a realidade ao nosso redor e tentar ter presente que certas palavras e expressões podem ser mais ofensivas para determinadas pessoas. Acima de tudo, é importante sabermos reconhecer as circunstâncias em que a pessoa com deficiência vive e respeitar as suas preferências de tratamento.
“O reconhecimento de que todas as pessoas são iguais em direitos, mas consideradas e respeitadas nas suas diferenças, é uma condição das sociedades inclusivas, livres e democráticas.”
Os Direitos das Pessoas com Deficiência em Portugal
“Pessoa com deficiência” ou “pessoa com diversidade funcional”, eis a questão
Nos últimos anos, o termo “pessoa com diversidade funcional” começou a surgir de forma mais frequente em diferentes meios, tanto em estudos publicados sobre o tema como na comunicação social em geral.
Segundo diferentes especialistas, o termo “diversidade funcional” tem uma carga bastante positiva e resulta de vários anos de esforço por parte de muitos para consagrar o termo. De acordo com alguns investigadores, “pessoa com diversidade funcional” é a expressão que melhor reflete o que realmente somos, independentemente da nossa condição física ou mental, ou seja, pessoas que se adaptam ao meio ambiente com os recursos que têm à sua disposição, como por exemplo, pessoas em cadeiras de rodas.
No entanto, não é assim tão óbvio que “diversidade funcional” seja a expressão mais adequada para fazer referência a pessoas com deficiência se o objetivo é dar mais visibilidade e voz a este grupo de pessoas que todos os dias luta para ultrapassar diferentes obstáculos e estigmas. Em Espanha, por exemplo, a reivindicação de 2017 do CERMI (Comité de Entidades Representativas de Pessoas com Deficiência) das Ilhas Canárias espelha bem esta situação.
O Comité argumentou que através da expressão “pessoas com deficiência” a realidade, defesa e esforços de reconhecimento destas pessoas são apresentados à sociedade de uma forma mais clara, enquanto que a expressão “diversidade funcional” poderia ter menos impacto dado ser mais ambígua.
“Não mudes o nosso nome, ajuda-nos a mudar a realidade”.
Comité de Entidades Representativas de Pessoas com Deficiência das Ilhas Canárias
O poder da linguagem positiva
Acreditamos que o uso de linguagem positiva é a melhor forma de mudar mentalidades e a sociedade em que vivemos. Porque as palavras têm poder, o seu impacto sobre a nossa vida pode ser profundo e duradouro. É por isso que, no dia a dia, todos temos o dever de usar as palavras com cuidado e compaixão, quer estejamos a falar para aqueles que nos são mais próximos ou com alguém que acabamos de conhecer.
Tudo isto, é sabido, começa na família e continua na escola. Não devemos subestimar o poder da linguagem como instrumento educativo, especialmente quando se trata de educar toda uma sociedade. Sem esquecer que, acima de tudo, é necessário educar e dar as ferramentas necessárias às pessoas que vivem com limitações físicas, intelectuais ou sensoriais para que estas tenham os mesmos recursos à sua disposição para viver de forma digna e alcançar os seus objetivos e sonhos.
É importante termos consciência das diferenças que atravessam a sociedade e encontrar mecanismos que promovam a inclusão de todos e não a exclusão de alguns. É igualmente importante olhar para o futuro com esperança e trabalhar para construir uma história com base numa linguagem positiva.
A linguagem positiva é a ferramenta que abre horizontes, pois pode levar a que uma pessoa com deficiência se sinta parte integrante da sociedade e tão capaz de atingir os seus objetivos de vida como uma pessoa sem limitações. Sobre o poder da linguagem positiva, Luis Castellanos diz-nos que esta constrói pontes e é para isso que trabalhamos na Stannah:
Construir pontes de acessibilidade para que os nossos clientes possam alcançar a sua independência e liberdade, dentro e fora de casa.
Na Stannah, sentimos a responsabilidade de dizer “sim” à criação de “pontes” de acessibilidade que facilitem a eliminação de barreiras arquitetónicas e, desta forma, ajudem a promover a autonomia, integração e melhoria da qualidade de vida das pessoas com deficiência.
Fontes:
Guia Prático – Os Direitos das Pessoas com Deficiência em Portugal
Manual de etiqueta – Interação com a Pessoa com Deficiência
Um milhão e 700 mil portugueses têm incapacidade. Somos uma sociedade inclusiva?
Pessoas com Deficiência em Portugal – Indicadores de Direitos Humanos 2020